sábado, 21 de junho de 2014

SETE DIAS NO RIO


                                                    Ipanema vista da Pedra do Arpoador


Segunda de sol no Arpoador 

Há quantos milhões de anos essa pedra está aqui, nesse mesmo lugar onde estou, sentada displicentemente em seu corpo rochoso, a observar as ondas espalharem-se sobre a superfície áspera, molhando-a, lavando-a, respingando em nós, observadores inebriados pela força e beleza dessa dança de brancura e cinza, dureza e liquidez, amplidão e bruma, nessa manhã de sol? A Pedra do Arpoador brilha ao sol de segunda-feira e a Praia de Ipanema, à direita, é quase vazia, quase só minha e das poucas pessoas que caíram da cama cedo, para aproveitar o sol ainda ameno e escalar a pedra, que divide as praias de Ipanema e Copacabana.

A Pedra do Arpoador, assim como o Pão de Açúcar e o Corcovado, é formada de um material chamado gnaisse facoidal e tem cerca de 600 milhões de anos, segundo estudos geológicos da cidade. Localizada entre o Forte de Copacabana e a Praia de Ipanema, seu nome nos remete ao período colonial, quando índios e portugueses armavam-se com seus arpões para caçarem as baleias que percorriam nossa costa. Daqui de cima, recostada no corpo milenar das rochas, penso no milagre da visão da beleza e em sua força curativa. Olho ao meu redor e percebo o olhar extasiado de cada um dos que pararam a vida, por um instante, para se deixarem envolver pela paisagem, feita de céu, luz, cores, águas e montanhas.

Sei que muitas das edificações e monumentos coloniais da cidade do Rio de Janeiro, datadas do século XIX e inícios do século XX, foram construídas com essas rochas. Olho mais uma vez ao meu redor e respiro profundamente o ar fresco e úmido da manhã de sol, pronta para retomar a caminhada em direção ao Forte e à orla de Copacabana, deixando-me embalar pela memória de mais uma canção que exalta as belezas e delícias da cidade: “Copacabana, princesinha do mar / Pelas manhãs tu és a vida a cantar / E a tardinha o sol poente /Deixa sempre uma saudade na gente...”. Os versos são do samba Copacabana, com letra de Alberto Ribeiro e música de João de Barro, o Braguinha, gravado originalmente em 1946, por Dick Farney, e regravado dezenas de vezes por diversos artistas de nosso cancioneiro.

Como boa viajante, continuo o passeio com uma caminhada pelas largas calçadas de pedra portuguesa da orla de Copacabana e sigo até o Hotel Copacabana Palace, só para apreciar sua monumental visão. Construído nos anos 20, pelo empresário carioca Octávio Guinle, a partir de projeto do arquiteto francês Joseph Gire, o Copacabana Palace abrigou a lendária Golden Room, na década de 30, a primeira casa de espetáculos da América Latina, que trouxe ao Rio grandes nomes da música internacional, como Nat King Cole, Ray Charles e Ella Fitzgerald. Em 1989, o hotel foi tombado pelo Patrimônio Histórico Nacional, mesmo ano em que foi comprado pelo Orient-Express Hotels, um dos maiores grupos empresariais do mundo no ramo do turismo.

Depois, prossigo o passeio pela praia e, quando bate o cansaço, decido dar um mergulho nas águas geladas do mar de Copacabana e cochilar ao sol, embalada pelas cores e vozes dos ambulantes, com suas gingas, seus bailados, suas múltiplas falas, audíveis e logo abafadas pelo som das ondas quebrando na praia, uma vez, e outra vez e mais uma vez. À tardinha, quando o sol esfria, pego o caminho de volta para Ipanema, decidida a visitar o Forte de Copacabana e ali mesmo fazer uma rápida refeição, a tempo de apreciar o deslumbrante pôr-do-sol que se insinua no horizonte.

O início da construção do Forte de Copacabana se deu em princípios do Século XX, por volta de 1907, e o local escolhido foi a ponta da Igrejinha, que ficava exatamente aqui onde estou agora, na extremidade da Praia de Copacabana. As obras tiveram início em janeiro de 1908, mas o forte só foi inaugurado em setembro de 1914, pelo então presidente da República, Marechal Hermes da Fonseca. Em 1987, foi criado no local do forte o Museu Histórico do Exército e transformado em Espaço Cultural, onde se pode ver, ao ar livre, peças de Artilharia de Costa, dos séculos XIX e XX; além da exposição permanente do Museu Histórico do Exército, com peças dos períodos colonial, imperial e republicano.


Depois da visita às exposições e do passeio até o que parece ser uma continuidade da formação rochosa da Pedra do Arpoador, sento-me aqui – exausta, mas feliz - numa das mesinhas do Café do Forte, filial da tradicional Confeitaria Colombo, para fazer o desejado lanche e esperar o sol se pôr, colorindo as águas e as brancas areias do mar de Copacabana. “Copacabana o mar eterno cantor, / Ao te beijar, ficou perdido de amor, / E hoje vive a murmurar, só a tí, / Copacabana eu hei de amar...”, canto baixinho os versos de Copacabana, e deixo o tempo se arrastar.


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